O Sistema de Medição de D. Manuel I

As antigas unidades de medida portuguesas foram utilizadas em Portugal, Brasil e em alguns domínios coloniais portugueses até à introdução do sistema métrico. Tiveram origem nas unidades de medida romanas, árabes e outras. A maior parte das antigas medidas de peso e de capacidade foi um legado árabe.
Na altura da formação de Portugal (1128), o padrão de peso utilizado era o arrátel, do árabe al-ratl, que era um padrão moldado em ferro fundido ou em granito. Este padrão variou de acordo com os interesses, assim como todos os outros, pesando desde 353 até 459 gramas.

No ano de 1352, alguns povoados “portucalenses” queixaram-se à corte de Lisboa por se sentirem lesadas quer no pagamento dos direitos reais, quer nas rendas que pagavam a fidalgos e clérigos. A confusão nos padrões era tamanha que D. Pedro I (1357–1367) tentou impor um padrão único para todo o território português, decretando que os pesos sólidos tivessem como base as medidas de Santarém, e os líquidos as utilizadas em Lisboa.

Posteriormente, D. Afonso V (1438–1481), impôs os padrões de três cidades: Lisboa, Porto e Santarém. Embora houvesse diminuído, a confusão ainda imperava e no reinado de D. João II (1481–1495), devido a intensificação do comércio com o resto da Europa, adotou-se um novo padrão de peso – o marco de Colônia – um padrão que deveria ser feito em ferro forjado e serviria para pesar ouro e prata.

Quando se começou a conjecturar a introdução do sistema métrico decimal, no século XIX, as unidades de medida lineares e itinerárias, e bem assim as unidades de peso, tinham já padrões legais únicos em todo Portugal. As restantes unidades variavam de região para região, e mesmo de localidade para localidade, embora se situassem na ordem de grandeza dos padrões de Lisboa.

Em Portugal, o sistema métrico de unidades foi introduzido pelo Decreto de 13 de Dezembro de 1852, porém dividia espaço com o antigo sistema de medidas. O Decreto de 20 de Junho de 1859 estabeleceu como obrigatório o uso exclusivo do sistema métrico. Este decreto entrou em vigor para as medidas lineares, em Lisboa a 1 de Janeiro de 1860 e nas restantes localidades a 1 de Março do mesmo ano. A obrigatoriedade da utilização das restantes medidas, entrou em vigor, em todo o território nacional, em 1 de Janeiro de 1862.

Dom Manuel I (1495-1521), no âmbito da reforma das ordenações e dos forais, também empreendeu uma reforma dos pesos e medidas tão importante que se manteve em vigor até ao século XIX, inclusive no Brasil. A primeira tentativa de reforma e compilação das ordenações do reino foi iniciada em finais do reinado de Dom João I e concluida já no reinado de Dom Afonso V, deixando como resultado as chamadas Ordenações Afonsinas. O complemento natural desta reforma seria a reforma dos forais.

Logo após a subida ao trono, em 1495, Dom Manuel criou uma comissão para examinar e dar parecer sobre a sua reforma dos forais. O rei pretendia submeter toda a nação a uma única norma jurídica e, ao mesmo tempo, actualizar os tributos estipulados nos velhos forais em função de moedas, pesos e medidas correntes e únicos.

Dom Manuel I tomou como ponto de partida os pesos e medidas de Lisboa, introduzindo algumas alterações. As medidas lineares continuaram a ser as que já estavam em utilização um pouco por todo o reino desde o tempo de Dom Dinis. As medidas de capacidade eram as usadas em Lisboa desde o século XIV, ou seja, um alqueire de 13.1 litros e uma fanega de 4 alqueires, um almude de 16.8 litros, dividido em 12 canadas ou 48 quartilhos, etc.. O moio, no entanto, passou de 12 para 15 fanegas.

Os pesos passaram a ter como base um arrátel de 16 onças, em teoria equivalente à libra castelhana. O quintal manteve a relação tradicional com o arrátel, ou seja, o quintal continuava a ter 128 arráteis (arráteis que já tinham sido de 12.5 onças, depois 14 onças e agora eram de 16 onças), embora em Castela continuasse com as tradicionais 100 libras. Com a redefinição do arrátel, o sistema português de pesos passou nesta altura a ser puramente binário (vide tabela a seguir). Os valores que seguem são, essencialmente, os estabelecidos pelo Rei D. Manuel I em 1495.


O aspecto mais consequente da reforma de Dom Manuel I consistía na efectiva distribuição de cópias dos padrões dos pesos às principais localidades do reino, padrões esses fabricados em Flandres, em 1499. Esse fato permitiu uma mais rápida uniformização dos pesos, mantendo-se esses padrões em uso até ao século XIX. 

Dom Sebastião I acabaria por sentir a necessidade de proceder da mesma forma relativamente às medidas de capacidade. Na verdade, este rei distribuiu cópias dos padrões reais de medidas de capacidade de secos e líquidos às principais localidades do reino. Relativamente às medidas lineares, nunca chegaram a ser distribuídos padrões, certamente por não se ter achado necessário. 

No restante da Europa o panorama de confusão metrológica e os esforços de uniformização eram similares. Após a unificação dos reinos de Castela e Aragão sob a coroa dos reis católicos, estes soberanos, em duas pragmáticas de 1488, ordenaram de um único padrão de pesos, quer na pesagem dos metais preciosos, quer nas transacções comerciais. Em 1496-1497, Henrique VII de Inglaterra procedeu a uma importante reforma metrológica no seu país, no âmbito da qual foram enviadas cópias dos padrões dos pesos e medidas a quarenta e três das principais localidades do país. É também desta época (segunda metade do século XV ou primeiros anos do século XVI) a famosa pilha de pesos conhecida como pile de Charlemagne, hoje conservada em Paris no Conservatoire des Arts et Métiers. 

No Brasil, e não sem muita controvérsia, o imperador D. Pedro II, através do Decreto nº 1.157, de 26 de junho de 1862, substituiu em todo o Império o antigo sistema pelo sistema métrico decimal, na época chamado de sistema métrico francês. O Decreto estabelecia um prazo de 10 anos para a substituição total, autorizava a mandar vir da França os padrões do sistema, e determinava a organização de tabelas comparativas para facilitar a conversão das medidas de um sistema para outro. Assim, o sistema métrico foi adotado na prática somente em 1872.

Bibliografia - Luís Seabra Lopes - A cultura da medição em Portugal ao longo da história.

Cálculo do peso em gramas




A barra acima tem seu peso determinado em 3 onças, 6 oitavas e 46 grãos. Com base nos dados da tabela anterior, podemos calcular o peso da barra em gramas:

3 onças = 3 x 28,6848 gr.= 86,0544 gramas
6 oitavas = 6 x 3,5856 gr.= 21,5136 gramas
46 grãos = 46 x 0,0498 gr.= 2,2908 gramas
                              Total : 109,86 gramas

1 onça = 28,6848 gr.; 1 oitava = 3,5856 gr.; 1 grão = 0,0498 gr.